O
funcionamento de casas de diversões, bares, shows,
seu disciplinamento e a imposição da Lei Cinderela. - Por Márcio Dominici
Qual o objetivo de se querer acabar
com a vida noturna de uma cidade do porte de Santa Inês? Quais as consequências
para o comércio e empresariado que sobrevive da exploração de festas, bares e
assemelhados nesse período do dia?
Em face de tais indagações resolvi
tomar a liberdade de trazer alguns posicionamentos.
È preciso que se saiba que a
sociedade, para aqueles que a pensam dialeticamente, é sempre uma totalidade de
relações e tais relações caracterizam-se por sua dinamicidade, viver em
sociedade é antes de tudo saber posicionar-se diante dos direitos e anseios dos
demais.
O descanso noturno, o lazer, o
trabalho, a livre iniciativa, são direitos ou princípios legais garantidos a
todo cidadão, devendo haver consciência que viver em sociedade é antes de tudo
conviver com diferenças.
A
autorização para realização de festas e funcionamento de bares, boites e
assemelhados é prevista legalmente no Dec.
5068/73, LEI Nº 8.192 DE 03 DE
DEZEMBRO DE 2004 regulamentado pelo
DECRETO Nº 21.201 DE 05 DE MAIO DE 2005.
Art. 3º
- Nenhum divertimento público se realizará no Estado do Maranhão, sem Alvará de
Licença expedido pela autoridade competente, na forma determinada por este
Decreto.
Art. 4º - O
licenciamento e a fiscalização das diversões públicas em geral competem:
I -
na Capital, à Secção de Costumes e Diversões Públicas, sob a supervisão do
Departamento de Segurança Pública;
II
- No interior, às Delegacias de Polícia,
que também obedecerão ao controle do Departamento de Segurança Pública;
O
art. 4º do Dec.5068/73 é expresso ao atribuir às Delegacias de Polícia a expedição da autorização para realização de
eventos e funcionamento de bares.
Não
é objeto deste articulado discutir a natureza jurídica do ato emitido pela
autoridade policial tocante ao funcionamento de bares e casas de show, se
licença ou autorização.
Isto
posto, assevera-se ainda que não há questionamentos quanto a atribuição dos
órgãos de Polícia Judiciária em emitir alvará de funcionamento, conforme
decreto epigrafado, pairam dúvidas, no entanto, no que pertine ao horário
de funcionamento das casas de show, bares e assemelhados.
Acreditamos
que tal celeuma decorre primordialmente da ausência de normativo municipal
regulamentando o horário de funcionamento de tais divertimentos, o que dá azo
para decisões precipitadas.
È de
conhecimento geral que o horário de funcionamento das casas de diversões, bares
e shows será regulamentado, onde houver, por Lei municipal, posto ser de competência dos municípios legislarem sobre tal matéria conforme
decisões reiteradas do STF:
STF - AG.REG.NO AGRAVO DE INSTRUMENTO:
AI-AgR 481886 SP
CONSTITUCIONAL.
ADMINISTRATIVO. MUNICÍPIO: HORÁRIO DE FUNCIONAMENTO: ESTABELECIMENTO COMERCIAL:
COMPETÊNCIA MUNICIPAL. SÚMULA 645-STF.
I. - A fixação de horário de funcionamento de
estabelecimento comercial é matéria de competência municipal,
II. -
Incidência da Súmula 645-STF.
IV.
- Agravo não provido.
STF - AG.REG.NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO:
RE-AgR 285449 SP
Administrativo.
Município. Horário de funcionamento de estabelecimento comercial. Competência
municipal (CF, art. 30, I).
TJPR - Agravo de Instrumento: AI 1619338
PR Agravo de Instrumento - 0161933-8
RECURSO
NÃO PROVIDO.
Em
2007 o Supremo tribunal Federal também julgou inconstitucional (ADI 3691
proposta pela CNC) portarias da SSP do MA, PI e PA que disciplinavam o horário de funcionamento dos estabelecimentos
de diversões, dentre os quais os que vendiam bebida alcoólica, “os ministros
endossaram o argumento da CNC de que a portaria invadiu competência dos
municípios, aos quais cabe legislar sobre o horário de funcionamento do
comércio, por se tratar de matéria de interesse local”.
Sugere-se a leitura de
decisão FAVORÁVEL ao impetrante em sede
de MS (CÂMARAS CÍVEIS REUNIDAS Mandado
de Segurança nº 015849-2009 São Luís/MA.: “Trata-se de Mandado de
Segurança Preventivo com pedido de liminar, impetrado por FJC Festas e Eventos
LTDA (Pirata Beach), contra suposto ato ilegal e abusivo praticado pelos
promotores integrantes das promotorias do meio ambiente, investigação criminal
e infância e juventude, que determinou em ata de reunião (Operação Manzuá) do
dia 01/04/2009, o limite máximo de funcionamento dos bares, restaurantes e
casas noturnas até 02:00h... No
caso em apreço, após a análise do conjunto probatório coligido aos autos
vislumbro , prima facie, estarem presentes os requisitos autorizadores da
concessão de liminar.
Nesse
diapasão assevera-se que carece base legal qualquer regramento da matéria no
tocante ao horário de funcionamento que não seja o previsto no festejado
Decreto estadual, portaria judicial, mormente em Lei municipal.
Há
notícias de que o proprietário de uma festa denominada “pagode na laje” ao ser
fiscalizado apresentou a licença expedida e assinada pelo delegado regional, o
responsável pela fiscalização, após recebê-la, teria amassado e jogado fora
(sic), bom, mas parece que ninguém tá respeitando mesmo as licenças expedidas
pela PC-MA, então nesse caso seja quem for que tiver feito tal absurdo não
precisa se preocupar em responder pelo crime de supressão de documento público
(art. 305 do CPB), isto se os fatos que me foram narrados forem verdadeiros,
mesmo porque não tenho informações se foi tomada alguma medida no âmbito da
Polícia Civil.
Indaga-se:
Será a imposição de um toque de recolher? se assim o for, quem o decretou? Tem
validade legal ou é imposto apenas pela utilização da força?
Em uma
cidade do porte de Santa Inês não é razoável que vigore a Lei da Cinderela, onde a meia noite
todos devam se recolher (ainda que por imposição de terceiros), de qualquer
sorte, diante de tudo que, repito, estarrecido observo, parece mesmo não haver
nada mais importante pra se fazer neste município. Resta aos prejudicados a
última tábua de salvação: O Poder
Judiciário. Sem esquecer que nesta
vida tudo passa, peço: perdoem-vos, eles não sabem o que fazem!
Márcio Fábio Dominici
Delegado de Polícia